Entrevistas com especialistas

Desafios para Controle de Qualidade e necessidades especiais de desenvolvimento para Terapias Celular e Genética (ATMPs)

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Os Testes Microbiológicos, ou seja, conteúdo microbiano (bactérias, leveduras e bolores), endotoxinas e micoplasma, são apenas uma parte do controle de qualidade realizado para os produtos da terapia celular e genética.

Nesta  “Entrevista com Especialistas” publicada na CELL & GENE THERAPY INSIGHTS, Felix Montero Julian (Diretor Científico para a área da Saúde, bioMérieux) e Rey Mali (Vice-Presidente Vendas e Marketing, Accellix) compartilham suas visões sobre os desafios atuais em Controle de Qualidade e necessidades específicas para o desenvolvimento de terapias celulares e genéticas .

Félix Montero Julian reconhece que o tempo está passando e, enquanto Diretor Científico dos Negócios na área da Saúde, da bioMérieux, líder mundial do diagnóstico in vitro, entende a necessidade urgente do oferecimento da terapia celular e genética como a última alternativa a um paciente.
A procura por medicina regenerativa está crescente - seja para o câncer, anemia falciforme, lesões da medula espinal, ou transplantes de medula óssea", diz Rey Mali, VP de Vendas e Marketing da Accellix, empresa fabricante de uma plataforma de citometria de fluxo automatizada em formato de cartuchos. “Isto é o futuro para os tratamentos.”
Com tanta coisa em risco, os testes de controle de qualidade são cruciais nos processos de fabricação. Com os testes de segurança e as análises de qualidade dos testes celulares representando 80% das necessidades de controle de qualidade (CQ) [1], é válido questionar se as estratégias de CQ asseguram a precisão, consistência e disponibilidade ágil dos produtos de terapia celular.

“O tempo é importante. Precisamos de acelerar desenvolvimento e produção da imunoterapia. Precisamos ajudar as empresas a acelerar o controle de qualidade destes produtos e a disponibilizá-los aos pacientes em tratamento". - Félix Montero Julian

Felizmente, avanços significativos contribuem para o desenvolvimento, fabricação e controle destas terapias para os pacientes que aguardam tratamento urgente. Em 2020, Félix Montero Julian da bioMérieux e Rey Mali da Accellix formaram um time com o mesmo objetivo final: agilizar os testes de controle de qualidade - segurança e análise de critérios celulares - com um fluxo de trabalho mais abrangente para acelerar produção e controle das terapias celulares e genéticas. Esta parceria é realizada em conjunto com empresas dedicadas à produção de terapias celulares e genéticas visando:

1. Melhorar os processos de desenvolvimento, fornecendo testes automáticos e rápidos, com resultados práticos e redução dos tempos de preparo;
2. Reduzir o custo do controle de qualidade tornando estas terapias mais acessíveis 
3. Assegurar que qualquer terapia celular ou genética administrada a um paciente seja segura, eficaz e que cumpre um conjunto pré-definido de parâmetros de qualidade.

Como o tempo de espera afeta a produção de terapias celulares e genéticas e os seus pacientes?

RM: A produção de terapias celulares e genéticas demora, em média, entre 2 a 4 semanas. À medida em que novas investigações e ensaios se desenvolvem, o tempo também está diminuindo gradativamente. No entanto, o paciente continua à espera de três semanas a um mês, do momento em que doa o seu sangue até o momento em que é administrada a sua terapia. Durante esse processo de desenvolvimento, existem muitos e diferentes pontos de controle de qualidade que verificam: O processo está seguindo como planejado? Podemos injetar as células no paciente? O lote tem a contagem adequada de células? As células foram corretamente modificadas?

FMJ: A maioria das técnicas microbiológicas ainda depende de métodos padrão em que as amostras são colocadas em meios de cultura . Por norma, este tipo de culturas demoram algum tempo. Os testes de esterilidade requerem 14 dias, conforme regulamentado pela farmacopeia. Não podemos esperar 14 dias para obter resultados referentes a estes produtos, porque os pacientes vão ter de esperar ainda mais tempo. Felizmente, temos as tecnologias para detectar a presença de micro-organismos nas amostras em poucos dias. Algumas delas produzem resultados entre 5 a 7 dias, utilizando métodos baseados em crescimento.

Qual é o impacto de baixos volumes de produção para as terapias celulares e genéticas?

FMJ: Os testes microbiológicos, inclusive conteúdo microbiano (bactérias, leveduras e bolores), endotoxinas e micoplasma, são apenas uma parte do controle de qualidade realizado nos produtos de terapia celular e genética.

São necessárias diferentes amostras do produto final para realizar estes três diferentes testes. Os outros testes estão relacionados com as próprias células - estes são denominados testes de atributos de qualidade celular. As nossas tecnologias são compatíveis com pequenos volumes de amostras e isso é crítico porque estes produtos não são feitos aos milhares e milhares de litros. Por exemplo, os fabricantes de anticorpos monoclonais têm a capacidade de produzir centenas de milhares de litros de produto e, por isso, é menos problemático reduzir o volume retirado para testes. Do lado oposto, os produtos finais da terapia celular e genética são apenas várias centenas de mililitros. Nesse caso, os fabricantes precisam de utilizar o volume mínimo do produto para fazer todos os testes mencionados anteriormente e manter a maioria do produto para infusão no paciente. Para as terapias celulares e genéticas, é importante trabalhar com o volume mínimo de produto, e assegurar a velocidade na obtenção de resultados. Isto é um ponto crítico. As nossas tecnologias podem reduzir até metade o tempo dos testes de esterilidade.

“Para as terapias celulares e genéticas, é importante trabalhar com o volume mínimo de produto e assegurar a velocidade na obtenção de resultados.” - Félix Montero Julian

Qual é o papel da mão-de-obra no processo de controle de qualidade das terapias celulares e genéticas?

RM: Cada empresa possui seus próprios procedimentos sobre quantos pontos de verificação de controle de qualidade precisa, porque todas tem produções e produtos diferentes. Algumas empresas têm cinco pontos de verificação, outras seis, e outras oito durante o processo.
E cada um desses pontos de verificação do controle de qualidade monitoram a esterilidade ambiental ou os atributos de qualidade celular, o que, portanto, envolve muito tempo e mão-de-obra. O tempo de resposta é crítico porque, do outro lado, está um paciente em risco de morte à espera do tratamento. Com as nossas tecnologias, os próprios operadores das linhas de produção podem gerir os testes com facilidade e precisão, dispensando a necessidade de se ter pessoal altamente qualificado e eliminando os processos manuais que acrescentam variação.

Que impacto a acessibilidade possui em pacientes de terapias celulares e genéticas?

RM: Há limites para a mão-de-obra e seu dia de trabalho típico contém 8 horas. Durante os ensaios clínicos, você recruta pacientes que chegam a qualquer hora do dia e, por isso, o laboratório precisa de estar disponível 24 horas por dia, sete dias por semana. Por exemplo, na semana passada, visitámos uma instalação regulada pelas boas práticas de fabricação (BPF), onde se testa medula óssea. Os pacientes chegam no meio da noite. Vale a pena fazer análises ou processos manuais com um colaborador às 2 da manhã e depois confiar nesses resultados para tratar um paciente? E se ele estiver cansado? E se estiver exausto? O que acontece a seguir? Sem tecnologias de controle de qualidade, que operem a qualquer hora do dia, todos os dias da semana, você põe em risco a qualidade do tratamento.

Como os fabricantes de terapias celulares e genéticas lidam neste campo novo e dinâmico?

FMJ: Há muitos alvos que os cientistas identificaram como fundamentais para enfrentar diferentes tipos de tumores. Existe também a possibilidade de combinar terapias celulares com outras abordagens, tornando-as mais eficazes no tratamento de câncer. Tudo isto, obviamente, deixa o FDA mais cauteloso e coloca-se mais etapas de controle no processo burocrático. Já ouvimos falar de relatórios em que o FDA expressou suas preocupações sobre a falta de testes e medidas consistentes para assegurar a qualidade da terapia. Aqui, podemos acrescentar muito valor porque fornecemos tecnologias consistentes e que respondem a estes requisitos e expectativas do FDA.

Quando o desenvolvimento do ensaio personalizado para os clientes faz sentido?

Temos alguns ensaios prontos, mas na maior parte dos casos, o plano a longo prazo nossos clientes é desenvolver ensaios personalizados e específicos para a terapia celular que estão desenvolvendo. Os clientes utilizam, normalmente, os nossos kits prontos para monitorar a qualidade das células recebidas antes do processamento ou para lidar com eventuais impurezas. E então, após as células serem geneticamente modificadas, utilizam um ensaio personalizado. Assim, para cada terapia celular, o fabricante implementará múltiplos pontos de verificação de controle de qualidade e, antes do produto ser liberado, o fabricante realiza o controle de qualidade garantindo tanto que a amostra não está contaminada como que a modificação genética foi bem sucedida. O ensaio personalizado durante os testes de liberação do produto é um ponto crítico para aprovação da plataforma, porque isso é descrito nos seus POPs (Procedimentos Operativos Normalizados), que, além de serem submetidos ao FDA, determinam como o produto é fabricado.

"O ensaio personalizado durante os testes de liberação do produto é um ponto crítico para aprovação da plataforma." - Rey Mali

Qual a sua visão de futuro para as terapias celulares e genéticas?

FMJ: É empolgante porque este tipo de terapias é atualmente a última alternativa de tratamento para o paciente. As respostas dos pacientes às terapias atuais, é de cerca de 10%. As taxas de resposta de alguns ensaios clínicos recentes de terapias celulares e genéticas, foram de 60%. Assim, passar de 10% para 60% é uma grande vitória.

O resultado global é tão positivo porque é apenas a uma injeção. Isto pode reduzir toda a pressão econômica no sistema de saúde. Ao invés dos pacientes irem frequentemente aos hospitais e permanecerem lá por um longo período de tempo, com as terapias celulares e genéticas, os pacientes vão apenas uma vez para uma injeção celular. Após a infusão do produto, os pacientes ficam em observação contínua durante alguns dias devido aos efeitos secundários das terapias CAR-T. E sim, o custo é elevado. Mas o objetivo é reduzir o custo com novas tecnologias e com novas abordagens de produção.

RM: Uma terapia celular (por exemplo um tratamento CAR-T autólogo para leucemia) custa cerca de meio milhão de dólares por tratamento. O sequenciamento genético estava posicionado neste mercado há cerca de 20 anos, e seus custos eram elevados. Atualmente o custo de sequenciamento genômico é inferior a 1.000 dólares por genoma total, e é este o caminho que esperamos que as terapias celulares possam seguir. Nós fazemos parte desta solução.

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